Tenho ficado impressionado, nos shows a que venho assistindo, com a quantidade cada vez maior de quadradinhos luminosos na platéia. Também me admira o tempo em que esses quadradinhos permanecem erguidos ao longo do show como se os donos dessas máquinas quisessem por à prova o poder dos seus tríceps. A primeira vez em que isso me incomodou foi no show da Alanis Morissette em que um bendito atrapalhou minha visão com uma camera que permaneceu avidamente estendida quase todo o show como se a qualidade do próximo DVD da cantora dependesse só dele. O que leva uma pessoa a gastar mais de duzentos reais num ingresso para assistir a um show inteiro através de uma telinha de 5 polegadas? Pior: para se ter um arquivo de vídeo que quase sempre nunca mais será visto novamente?
Recentemente percebi uma outra coisa ainda mais triste: foi no show da Beyoncé, onde as centenas de quadradinhos luminosos prejudicaram a relação da cantora com a sua platéia. Claro, porque um cinegrafista não pode dançar, cantar, nem pular. Pensei: a que ponto chegamos. Um show desse porte com uma platéia mais preocupada em registrar do que em curtir aquele momento único.
Somos tão regidos pelos nossos gadgets que por vezes perdemos nosso senso crítico acerca do nosso comportamento e das oportunidades que perdemos diante de tantas facilidades proporcionadas pelo mundo digital. Não sou um xiita anti-tecnologia e não aplaudi aquela cena de “As invasões bárbaras” em que Sébastien atira um celular numa fogueira (não nego, porém que, naquele contexto senti um certo alívio). Até porque quem me conhece sabe que eu sou uma árvore de Natal digital: mp3, smartphone, netbook… Trata-se de como podemos dominar as coisas e não sermos dominado por elas. Seria ignorância da minha parte dizer, como muitos fazem, que “antigamente ninguém precisava disso” porque antigamente ninguém precisava de escova de dente e papel higiênico e nem por isso gostaria de abrir mão dessas coisas só por isso. A tecnologia está aí mesmo para facilitar a nossa vida. No entanto, impõe-se ao homem moderno o desafio de dizer às coisas suas reais funções e não o contrário. Hoje em dia produtos são lançados no mercado para só posteriormente se descobrir para que servem.
Há tanto o que se tocar, provar, cheirar no mundo além das (maravilhosas) experiências que se pode ter diante de um monitor de 19″. Se eu tivesse R$750,00 para ver a Beyoncé de pertinho, certamente preferiria experimentá-la in natura a vê-la como uma soma de pixels em 5 polegadas.